Fukushima: os novos (enormes) perigos
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Fukushima: os novos (enormes) perigos


Nos últimos tempos, os media dedicam pouco espaço aos acontecimentos de Fukushima. Isso pode fazer supor que a maior parte dos problemas esteja resolvida, sobrando apenas a "limpeza" e a recuperação da área interessada ao desastre. Mas assim não é.

As notícias acerca da perda de água contaminada e dos níveis particularmente elevados de radioactivade do ar têm provocado alerta nos ambiente científicos: porque apesar dos meios de informação ignorarem o assunto,  a situação em Fukushima é altamente preocupante. E é uma preocupação que vai interessa muito mais do que o Japão.

A verdade, nua e crua, é que a Tepco não sabe como travar as perdas: os cientistas não têm ideia das reais condições dos núcleos dos reactores nucleares. E os cenários são assustadores: a radiação poderia atingir Coreia, China e América do Norte de forma substancial.

Infundado alarmismo? Não parece. Até há quem seja ainda mais pessimista.
O especialista nuclear Arnie Gundersen e o médico Helen Caldicott afirmam que as pessoas deveriam evacuar o hemisfério norte do planeta se uma das piscinas de armazenamento do combustível em Fukushima entrar em colapso:
Mover-se ao Sul do equador, se isto acontecer, acho ser a lição que tiramos.
O ex-conselheiro da ONU, Akio Matsumura, define a remoção dos materiais radioativos em Fukushima "uma questão de sobrevivência humana".

Seja como for: o que está em causa em Fukushima vai muito além das fronteiras japoneses. Relata o The New York Times:
Milhares de trabalhadores e uma pequena frota de guindastes estão a preparar-se para um dos últimos esforços para evitar um desastre ambiental ainda maior, o que já fez que a China e outros Países vizinhos estejam cada vez mais preocupados: é a remoção das barras de combustível esgotadas no reactor n. 4 e seu armazenamento num lugar seguro.
O Telegraph:
Tom Snitch , um professor sénior da Universidade do Maryland, que tem mais de 30 anos de experiência em questões nucleares, disse que "[as autoridades japonesas] precisam de enfrentar os verdadeiros problemas, as barras de combustível irradiado na Unidade 4 e os tanques de pressão que perdem material". Acrescentou que "houve demasiado trabalho para limpar as paredes e as condutas dos reatores, que foi feito apenas para fazer alguma coisa .... Esta é uma questão crucial de alcance global e o Japão deve fazer muito mais.
O The Japan Times:
Em Novembro, a Tepco planeia começar a delicada operação de remoção do combustível exausto no reator número 4 [com] radiações equivalentes a 14 mil vezes a quantidade liberada pela bomba atómica de Hiroshima [...] Permanece vulnerável perante eventuais novos choques e também há o risco de liquefação do solo. Retirar o combustível exausto, que contém o mortal plutónio, é uma tarefa urgente [...] As consequências poderiam ser muito mais graves do que qualquer acidente nuclear que o mundo já viu. Se uma barra de combustível caísse, quebrasse ou ficasse presa enquanto está a ser removida, os possíveis piores cenários incluem uma grande explosão, a fusão na bacia ou um enorme incêndio. Cada uma destas situações pode levar a lançamentos maciços de mortais radionuclídeos na atmosfera, colocando muito do Japão - incluindo Tóquio e Yokohama - e também os Países vizinhos em grave risco.
A CNBC:
O esvaziamento da central nuclear japonesa de Fukushima está longe de estar controlado e pode acabar muito pior, como um especialista para a energia nuclear que participa no World Nuclear Industry Status Report [Relatório de Estado da Indústria Nuclear Mundial, ndt] alerta: "O grande perigo, tal como foi identificado pela Comissão da Energia Atómica no Japão, é o facto de que é possível perder água numa das piscinas de combustível exausto e que possa haver um incêndio deste combustível".
A CNN:
[Mycle Schneider, consultor nuclear]:"A situação pode acabar muito pior. Um grande incêndio do combustível exausto provavelmente poderia fazer parecer uma coisa pequena o actual desastre e poderia exceder a emissão de radioactividade de Chernobyl dezenas de vezes. Em primeiro lugar, as paredes da piscina podem ter perdas para além da capacidade de fornecer água para o resfriamento, ou um edifício do reactor poderia entrar em colapso, como resultado das centenas de réplicas [do terremoto, ndt]. Além disso, o revestimento do combustível pode incendiar -se espontaneamente emitindo toda a sua carga radioactivo".
A agência Reuters:
O operador da central nuclear japonesa em Fukushima prepara-se para retirar 400 toneladas de combustível exausto a partir do edifício do reactor danificado uma operação perigosa que nunca foi tentada antes nesta escala. [...] A Tokyo Electric Power Co (Tepco) já está envolvida numa batalha perdida para travar a água radioactiva que transborda duma outra parte da estrutura e os especialistas duvidam que seja capaz de remover com êxito todos os materiais.
"Eles vão ter dificuldades em retirar um número significativo de barras" diz Arnie Gundersen, engenheiro nuclear com vasta experiência como Diretor da Fairewinds Energy Education, que tem construído estruturas para o combustível nos EUA .
A operação, que começa em Novembro no reactor número 4, está cheia de perigos, incluindo a possibilidade de uma grande libertação de radiação [...] Isso poderia levar a um desastre pior do que a crise nuclear no Março de 2011, na usina de Fukushima, o pior do mundo depois do que aconteceu em Chernobyl, em 1986.[...]
O processo começará em Novembro e a Tepco planeia empregar cerca de um ano na remoção dos materiais, conforme relatado pelo porta-voz Yoshikazu Nagai. É apenas um passo no processo de desmantelamento da central, que está previsto durar cerca de 40 anos, com um custo de 11 biliões de Dólares. Cada conjunto de barras de combustível pesa cerca de 300 kg e tem 4,5 metros de comprimento. Há no total 1.331 conjuntos de combustível exausto e 202 conjuntos adicionais não utilizados são armazenados na bacia, afirma Nagai .
[...]
As barras de combustível exausto também contêm plutónio, uma das substâncias mais tóxicas do universo, que é formado durante as últimas fases do funcionamento do reactor.
[...]
"Existe o risco de situações críticas involuntárias se as barras forem distorcidas ou muito próximas umas das outras" diz Gundersen. refere-se a uma reação nuclear em cadeia que - se fosse deixada sem controle - poderia resultar numa grande libertação de radiação e de calor para cuja absorção o sistema de resfriamento da bacia não foi projectado.
"O problema duma situação crítica que afecta a bacia do combustível é que não pode ser interrompida. Não existem controle para trava-lo" diz Gundersen. "O sistema de refrigeração da piscina de combustível exausto é projetado apenas para remover o calor do decaimento, e não o calor gerado por uma reação nuclear em curso."
As barras também são vulneráveis ​​ao fogo em caso de serem expostas ao ar, disse Gundersen.[...]
A remoção das barras da bacia é uma tarefa delicada, geralmente assistida por um computador, de acordo com Toshio Kimura, um ex-engenheiro da Tepco que trabalhou por 11 anos no Fukushima Daiichi.
"Antes era um processo controlado pelo computador que memorizava as posições das barras exactas aos milímetros, mas agora  não é possível. Este processo deve ser feito manualmente, pelo que há um alto risco de que algo possa cair e quebrar as barras de combustível" continua Kimura.
A corrosão causada pela água salgada também terá enfraquecido a estrutura e os equipamentos, acrescentou.

ABC Radio Australia cita Richard Tanter, um especialista em questões nucleares e professor de relações internacionais da Universidade de Melbourne:
"O reactor da Unidade 4, que tem uma grande quantidade de combustível armazenado na sua bacia de combustível, está a afundar-se. Segundo o ex- primeiro-ministro Naoto Kan, afundou cerca de 31 centímetros e não é uma coisa estranha. Isto não é realmente surpreendente, dado o que aconteceu em termos de bombeamento de água, com as consequências do terremoto e do tsunami, as infiltrações contínuas de água no lençol freático. Este é um problema imediato, e se não for resolvido há uma extraordinária oportunidade de nos encontrarmos numa situação como aquela de Março de 2011, devido à possibilidade de um acidente de fissão na lagoa do combustível exausto que se encontra na Unidade nº 4".
A agência Xinua:
Mitsuhei Murata, ex-embaixador do Japão na Suíça, pediu oficialmente para retirar a candidatura de Tóquio para os Jogos Olímpicos, por causa do agravamento da crise em Fukushima, que segundo os especialistas não está limitada aos tanques de armazenamento mas estende-se às potencias rachas nas paredes das bacias do combustível nuclear exausto.
Japan Focus:
A piscina do combustível exausto foi danificada pelo terremoto e tsunami e encontra-se numa condição de deterioração. Permanece vulnerável perante novos choques e existe também o risco de liquefação do solo.[...] Esta é literalmente uma questão de segurança nacional: outro erro da Tepco poderia ser incrivelmente caro, até existencial, para o Japão.
O especialista em barras de combustível nuclear, o engenheiro Arnie Gundersen, explicou recentemente qual o principal problema:
Acho que estão a subestimar a complexidade da tarefa. Se pensas uma prateleira de combustível nuclear como um maço de cigarros, se extraíres um cigarro para cima ele vai sair; mas estas prateleiras estão torcidas. Agora, quando vão puxar o 'cigarro' para cima, é provável uma roptura e a libertação de césio radioactivo e de outros gases, criptônio e xenônio, para a atmosfera. Suspeito que, nos próximos meses de Novembro, Dezembro e Janeiro vamos ouvir que o edifício foi evacuado, que uma barra de combustível quebrou-se e que está a  emitir gases.
Suspeito que vamos ter mais fugas no ar a tentar extrair o combustível. Se extraído com muita força, vão quebra-lo. Acho que as prateleiras estão tortas, o combustível está superaquecido - e que a bacia chegou a ferver - e a consequência natural é que é provável que uma parte do combustível permanecerá preso lá por um longo, longo tempo.
Chris Harris, engenheiro e ex- operador sénior de reactores e engenheiro:
Algumas imagens que foram distribuídas recentemente mostram que uma grande quantidade de combustível está danificado e, portanto, quando vão para agarrá-lo e tirá-lo, estará prestes a desmoronar. O boreflex [material de protecção, ndt] foi devorado: a água salgada não lhe faz muito bem.
Nas mãos da Tepco

Esta delicada situação fica agora nas mãos da Tepco.
Uma garantia, sem dúvida.


É esta a empresa que tinha sido alertada por engenheiros acerca dos riscos de Fukushima, muitos anos antes do acidente, pois os reactores não eram sismicamente seguros: os reactores foram danificados mesmo antes do tsunami atingi-los.

É por isso que um relatório do governo japonês concluiu que o acidente de Fukushima foi um desastre devido "a causas humanas ", provocado pelas culpas conjuntas do governo e da Tepco,, com uma má projectação do reactor.

A Tepco soube imediatamente após o acidente de 2011 que três reactores nucleares tinham perdido a capacidade de armazenamento, que o combustível nuclear tinha "desaparecido", e que não houve, de facto nenhuma contenção. A Tepco tem tentado desesperadamente de esconder tudo isso por dois anos e meio, fingindo que os reactores estavam na fase de "desligamento frio".

A Tepco acabou de admitir que há 2 anos é sabido de que grandes quantidades de água radioactiva está a filtrar até os lençóis freáticos e até no Oceano Pacífico.

As recentes tentativas da Tepco para solidificar o terreno onde surgem os reactores através do uso de produtos químicos falhou miseravelmente. E agora pensa em congelar o terreno da usina, ideia já recusada por numerosos especialistas.

A Tepco divulgou valor de radioactividade do ambiente inferiores aos reais por ter utilizado equipamento e detecção calibrado erroneamente.

E agora é a Tepco que vai enfrentar a fase mais delicada de todo o processo...


Ipse dixit.

Fontes: no texto



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