Um artigo muito interessante do Nobel da Economia, Paul Krugman no New York Times: "Uma Queda Continua?"
Afirma o economista:
E se o mundo como foi vivido nos últimos cinco anos for o novo mundo 'normal' ? E se as às condições de depressão generalizada forem para durar, não por dois ou três anos, mas por décadas?
Porque Krugman acha que a economia abrandou, talvez de forma definitiva? Por que o crescimento da população (especialmente nos Estados Unidos e nos outros Países industrializados) parou :
Um população que cresce cria uma procura por novas residências, etc. Quando o crescimento da população pára, essa demanda cai.
O que é verdade. Então a solução é começar a procriar como coelhos? Só isso? Parece pouco...Na Índia são mais de um bilião de pessoas, deveria ser um dos Países mais ricos do planeta.
Deve haver algo mais.
Outro factor importante poderiam ser os persistentes deficits comerciais, que apareceram pela primeira vez nos anos '80 e que continuaram a oscilar desde então e nunca desapareceram.
"Deficit comercial": significa que um País importa mais e exporta menos. Por exemplo: os Estados Unidos importam muito da China mas exportam pouco para a China.
Mas isso nos Estados Unidos: nem em todo o resto do mundo as coisas estão assim. Além de que, esta é a lógica consequência dum mundo globalizado: nada mais de barreiras comercias, naturais ou artificiais, mercadoria que circula para o planeta todo, produção concentrada nos Países onde a mão de obra for mais barata. Será cada vez mais difícil, ou até impossível, ter uma balança comercial equilibrada.
Mas estas são as únicas duas causas que Krugman consegue individuar: poucos filhos e demasiadas importações. E bravo o nosso prémio Nobel da Economia.
Não é um sistema que já deu o que tinha para dar e que agora não tem pernas para continuar; não é o facto de sermos governados, a nível global e muitas vezes regional também, por um bando de psicopatas; não é que o preço do petróleo, cada vez mais alto, sufoca o crescimento nas nações mais industrializadas; não é o facto da Finança estar nas mãos de indivíduos sem escrúpulos, que venderiam até a avó para ganhar algo.
Não: o problema é que temos poucos filhos e exportamos pouco.
Krugman fala sobre os preocupante níveis da dívida imobiliária nos Estados Unidos. A relação entre dívida e rendimentos, explica o economista, tem sido bastante estável ao longo do período 1960-1985 , elevando-se de forma rápida e inexorável entre 1985-2007, quando a crise eclodiu. No entanto, apesar do aumento da dívida imobiliária dos cidadãos, o desempenho geral da economia durante este período foi medíocre e a procura não mostrou qualquer sinal de querer superar a oferta.
Assim, a dívida imobiliária tem crescido de forma a apoiar os níveis mais elevados de consumo, mas, apesar disso, o PIB real não cresceu, até estourar a bolha imobiliária.
Tudo isso é verdade. Só que Krugman não é capaz de dar o passo seguinte, ou seja explicar aos seus leitores que a dívida imobiliária atingiu os limites naturais: uma família não pode contrair seis ou sete mútuos só para fazer crescer o PIB.
Krugman deveria também explicar que, sobretudo nos últimos anos antes da crise, a compra de imóveis não poderia sozinha ter feito crescer o PIB: o dinheiro arrecadado pelos bancos não foi reinvestido em produtividade, mas em boa medida serviu para operações especulativas, que não produzem riqueza geral; e, já antes do início da crise, serviu para cobrir as imensas despesas dos títulos tóxicos (contractos dos bancos feitos com pessoas que nunca poderiam ter pago as dívidas contraídas).
Contiuna Krugman:
Se a nossa economia mostra uma persistente tendência para a depressão, prepare-se para viver por um tempo muito ainda, à luz destas novas regras de depressão económica, onde a virtude é má e a prudência é insensatez, onde novas tentativas de poupança (incluindo aquelas para reduzir o deficit orçamental) não conseguem senão piorar as coisas.
Tudo verdadeiro: mas o que está em causa não são as soluções, são as causas. E sem individuar as causas reais, qualquer solução só pode prolongar o actual estado de crise. E é exactamente isso que acontece.
Economia significa fazer escolhas difíceis (claro, em detrimento de outros), não é apenas levar as pessoas a gastar mais.
Eis o problema: qual o sentido de "levar as pessoas a gastar mais"?
Uma pessoa gasta se tiver dinheiro. Se não tiver, não gasta. Um salário mínimo possibilita apenas um gasto mínimo e não há maneira de contornar esta regra básica.
Quisemos a globalização, quisemos a produção deslocada para Países mais convenientes, em termos de custo de mão de obra e em termos de fiscalidade. Isso teve consequências pesadas: os ordenados nos Países industrializados apontam para baixo, não para cima, e a situação é destinada a piorar.
Normal: o poder contractual dum empresa foi amplificado, o do trabalhador foi encurtado. Muito mais conveniente produzir na China ou na Índia, os trabalhadores ainda no activo nos Países industrializados sabem que o lugar de trabalho está permanentemente em risco.
Gastar mais? Pelo contrário: poupar ao máximo, porque não se sabe o que pode acontecer amanhã.
Fazer mais filhos? Uma vez um número maior de filhos era sinónimo de riqueza: mais filhos significava ter mais braços nos campos. Mas hoje, na sociedade industrial, um filho significa desde já um aumento das despesas e, no longo prazo, a incerteza acerca do futuro dele. Ninguém deseja um filho desempregado.
Krugman não consegue (ou não quer, que é mais provável) sair do esquema, o mesmo ao qual deve o Nobel dele. Não tenham ilusões: nenhum economista de regime irá dizer-vos que o sistema atingiu o limite. Serão procuradas improváveis causas, serão fornecidas soluções temporárias, no futuro será também encontrado um inimigo comum. Tudo acompanhado por previsões negativas, no fundo das quais será possível ver um luz, pequena, tremula, incerta e, sobretudo, sempre muito distante.
Para já, continuará a ser dito, temos que sofrer.
Porque construímos a nossa economia segundo a regra dum consumo e duma população cada vez maiores, e ninguém quer pôr em discussão este princípio. Não sou partidário do decrescimento, há uma outra via entre o crescimento infinito oferecido por esta sociedade e as privações no limite do masoquismo. Mas nada será feito sem uma redistribuição das riquezas e sem o abandono dos combustíveis fósseis.
Até lá, teremos que ouvir a orquestra tocar enquanto o Titanic afunda.
Nota: parece um final pessimista? Mas não é. Continuo a pensar que a nossa é sorte: vivemos num daqueles raros momentos da História no qual há a passagem dum modelo de sociedade para outro. É um privilegio. O Leitor não concorda? Paciência, está a vive-lo na mesma.Ipse dixit.
Fonte: New York Times
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