China: marcha atrás. Grillo: em frente.
Conspiração

China: marcha atrás. Grillo: em frente.


Wen Jiabao, o líder da China, decidiu fazer uma mudança de direcção. Antes a política de aumento do deficit em 50%, o que teria sido a salvação da Europa, agora é fechar as torneiras dos gastos e controlar a política monetária. E aumentar os impostos sobre os imóveis.

Como se não bastasse, há poucos reconheceu o Dólar como a moeda das próximas décadas. Pelos vistos não era apenas táctica.

Alguém conseguiu convence-lo? Parece. Quem? Não se sabe, mas podemos espreitar nos arredores de Harvard.

O quê significa tudo isso? Muitas coisas. Um revés na politica monetária europeia, luz verde para os Estados Unidos. E depois haveria o BRICS...

Em qualquer nação soberana, se o sector do governo reduzir os gastos públicos e aumentar os impostos, as empresas e os cidadãos são obrigados pôr mão ao bolso. É matemático. É como um jogo de cartas com dois participantes: se eu (governo) ganhar (reduzindo os gastos e aumentando os impostos), forço o outro jogador (o cidadão) a pagar. Um dos dois tem que perder, não é possível ganhar ambos.

Em Portugal sabemos muito bem isso, é só ver o que aconteceu nos últimos anos: cortes nos gastos públicos e aumento de impostos, cidadãos e empresas em crise, desemprego e tudo o resto.
Como afirmado: é matemático.

Agora, a China faz uma coisa profundamente errada e  escolhe fiar mais pobre. Não é apenas um problema chinês: há um efeito dominó em que as peças são tão grandes quanto o Monte Everest, pode iniciar em Pequim e dar duas voltas ao mundo. Chega na Europa? Óbvio. E apaga o que ainda estiver em pé. Não tudo, com certeza, mas muito sim.
Nesse ponto, os tecnocratas de Bruxelas começam a chorar, deliram de rigor das contas, de austeridade (procurem as últimas declarações do governador do Banco Central Europeu, Draghi). E assim ficamos mais pobres. Uma vez mais. Tu, Leitor, teu filho, a tua reforma, as tuas poupanças, etc.

O mesmo Draghi, em Julho de 2012, afirmou que "teria feito tudo o que for necessário para salvar o Euro". O quê significa isso? Significa que o BCE prometeu aos investidores proporcionar-lhes a proteção ilimitada dos investimentos deles, investimentos operados com os Títulos de Estado da Zona NEuro, com uma possível intervenção de potência máxima chamada operação definitiva Outright Monetary Transaction (OMT). Isso tranquilizou os mercados e estes começaram a comprar outra vez os Títulos de Portugal, Italia, etc. Nada de "resultados da austeridade", os vários Ministros da Economia não tiveram um papel nisso.

Dúvidas neste aspecto? Ok, então comparem dois dados e depois tentem explicar:
  • Dívida Pública portuguesa em 2011 (início oficial da crise e "ajuda" europeia): 107%
  • Dívida Pública portuguesa em 2012: 119%
  • Dívida Pública portuguesa hoje: 126%.
E "hoje" significa após o "glorioso" (e muito limitado) regresso aos mercados.
Fica mais claro assim? Mas o problema não era a Dívida Pública? A "boa vida", os gastos excessivos? Como é que o spread diminuiu? Um milagre ou foram as conjunções astrais? Porque obra do governo não foi, isso é evidente.

Mas atenção: o OMP não é uma brincadeira, porque força os Países a aceitar um programa de austeridade neonazi, coisas que a Grécia parece o Paraíso. Se não, nada de "ajuda" (ajuda com juros, óbvio: a Europa está unida, somos todos irmãos, mas o dinheiro é dinheiro, sobretudo quando for dos bancos privados, e não há almoços grátis).

O subtil humor alemão

Entretanto quê acontece em Italia? Acontece que dois terços dos eleitores (a propósito: sem contar com as coligações, o Movimento de Grillo resulta ser o partido mais votado) escolheram votar contra a austeridade e os mercados fizeram 2 +2: ou seja, com Grillo em Parlamento (e também Berlusconi, verdade seja dita) torna-se impossível aceitar a austeridade. Ergo não há OMT, a garantia do BCE desaparece.

Assim ficam mais claras as declarações de Peer Steinbruck, político do Spd, possível candidato após Merkel, o qual afirma ter ficado "pasmado com a vitória de dois palhaços". Não surpreende: Steinbruck é o mesmo que tinha ameaçado "enviar a cavalaria" caso a Suíça não colabore em matéria fiscal".
(a propósito: na Alemanha não gostam de Grillo, não gostam da Direita de Berlusconi, não gostam da Esquerda de Bersani, não é que sobre muita gente...ah, sobra Monti, pois...).

Consequência: o spread dos Títulos italianos em subida. Normal: é toda a construção do Euro que arrisca ruir. E isso sem contar com a vaga chinesa, que vai chegar.

Vai ser um período divertido, não há dúvida.

...e Grillo, entretanto...

Para concluir, eis as declarações dum dos dois "palhaços", Beppe Grillo, líder do Movimento 5 Estrelas. Explicam os resultados eleitorais e algo mais.
Os Italianos não votar acaso, estas eleições têm reafirmaram esta ideia, escolhem quem os representa. Na Itália, há dois blocos sociais.
O primeiro bloco, denominado A, é composto por milhões de jovens sem futuro, com um trabalho precário ou desempregados, muitas vezes licenciados, que vivem sob uma capa, um céu de chumbo. Estas pessoas procuram uma saída, querem eles mesmos tornar-se as suas próprias instituições, entornar a mesa, construir uma nova Itália sobre os escombros. A este bloco também pertencem os excluídos, aqueles que recebem uma pensão de fome, os pequenos e médios empresários que vivem sob um regime policial de impostos e que, e em caso de desespero, cometem suicídio.

O segundo bloco social, o bloco B, é formado por aqueles que querem manter o status quo, por todos aqueles que passaram pela crise, que começou em 2008, mais ou menos incólumes, mantendo o mesmo poder de compra, por uma maioria de funcionários públicos, por aqueles que têm uma pensão de mais de 5.000 Euros por mês, pelos que fogem ao fisco, pelo enorme círculo de pessoas que vivem através da política municipal e das concessões estatais.

A existência destes dois blocos criou uma assimetria social, há duas sociedades que coexistem sem comunicar uma com a outra.

O grupo A quer uma renovação, o grupo B a continuidade. O grupo A não tem nada a perder, os jovens não pagam o IMU [taxa sobre os imóveis, cavalo de batalha de alguns partidos ao longo da campanha eleitoral, ndt], porque não têm uma casa e nunca terão uma reforma. O grupo B não quer desistir de nada, muitas vezes tem duas casas, uma conta bancária decente e uma boa pensão ou a segurança dum trabalho público.

Perfila-se um choque de gerações, em que em vez das classes há a idade. Quem faz parte do grupo A, em geral votou M5S [Movimento 5 Estrelas, ndt], quem faz parte do grupo B para o Pds [Direita] ou PD [Esquerda]. Não há nenhum escândalo nestas eleições. É, no entanto, um voto de transição. As gerações mais jovens estão a suportar o peso do presente sem ter um futuro e não é possível pensar que isso dure por muito mais tempo ainda. A cada mês, o Estado deve pagar 19 milhões de Euros em pensões e 4 milhões de salários públicos. Este peso é insustentável, é uma questão de facto, o status quo é insustentável, é possível apenas alimentá-lo com novos impostos e novas dívidas, em que os juros são pagos também pelos impostos. É uma máquina infernal que está a drenar os recursos do País. Deve ser substituída por um rendimento de cidadania.

Nos próximos dias, vamos ver um renascimento do governo Monti, com outro Monti , Alfano, Bersani, Casini, como antes da eleição. Os M5S não alia-se com alguém tal como sempre foi dito, é o que vou dizer ao Presidente [da República] Napolitano na habitual rodada de consultações. O candidato a Presidente da República do M5S será decidido pelos membros do M5S através duma votação online. Ponto final.

A Primavera está a chegar.


Ipse dixit.



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