O que é o dinheiro: resumo - Parte III
Conspiração

O que é o dinheiro: resumo - Parte III


Então, até aqui conseguimos estabelecer que o dinheiro não existe, nem entre bancos e privados, nem no Estado. Ou seja, não existe um valor real e tangível, mas apenas um código abstracto que transmite os bens reais, que são o valor verdadeiro (coisa que o dinheiro não é!).

Mas agora que acabámos com a velha e errada ideia de que o dinheiro seja um valor, não podemos ignorar que a invenção da moeda teve outros fins, e muito mais importantes.

Desde pelo menos 5000 anos, a moeda é o monopólio de quem tem o poder de cria-la: desde os governantes de antigas civilizações, passando pelo Império Romano, os imperadores, os príncipes, até os Estados modernos, a questão do dinheiro sempre foi um monopólio.

O que é um monopólio? Simples: é uma situação particular em que um único vendedor detém o mercado de um determinado produto ou serviço. No caso do dinheiro, o monopólio era dos governantes (os tais réis, príncipes, Estados), os únicos que tinham ou têm o poder de cria-lo.

Mas por que isso? A razão é simples: o Soberano (vamos chama-lo assim, mas pode ser o antigo rei ou o moderno Estado) manteve para si o poder de criar dinheiro para conseguir o dinheiro de que ele precisava. Como? Através do poder de emitir o mesmo dinheiro e....dos impostos.

Pensemos nisso: se o Soberano (ou o Estado) não tiver o poder de nos obrigar a pagar impostos com o dinheiro dele, quem entre nós iria trabalhar para ele? Muito poucos, provavelmente ninguém.
Não ficou claro? Não faz mal, eis que calham bem dois exemplos, um inventado e o outro real.

Pedro e os Balboas

Pedro trabalha por conta do Estado brasileiro e ganha um rio de dinheiro. No fim de semana vai com toda a família num centro comercial: compram e comem como uma manada de búfalos porque o Estado paga bem e os donos das lojas são bem felizes de vender.

Até que um dia o chefe do Pedro diz: "Ó Pedro, venha no meu escritório". Pedro pensa "Um aumento?". O que é verdade mas também há uma novidade. Dilma escolheu poupar uns trocos e a partir daí paga todos os funcionários estatais em Balboas, que é a moeda de Panamá. A ideia é boa, o Balboa custa pouco e o Estado Brasileiro poupa com isso. Só que há um pequeno senão: o Balboa não é a moeda oficial do Brasil e a comida do centro comercial ainda deve ser paga em Reais. Não só: os impostos também!

Pelo que: Pedro ganha como antes (aliás, até um pouco mais com o aumento), só que agora é pago em Balboas e para gasta-los deve ir até Panamá. Não só: mas tem ainda que arranjar os Reais para pagar os impostos no Brasil.

Podemos pensar: bom, Pedro pode entrar numa agência de câmbio e trocar os seus Balboas para Reais. O que é verdade: só que trocar dinheiro custa e com esta operação Pedro não apenas anula o efeito do pequeno aumento como também perde parte do antigo ordenado. Então o que faz Pedro? Despede-se e vai a trabalhar numa empresa que paga directamente em Reais.

Mais simples, não é?

A vidinha dos nativos

Vamos agora ver um exemplo bem mais sério, pois trata-se aqui de História.

Quando os Ingleses chegaram na África, tentaram forçar os nativos a trabalhar por conta deles: todos trabalhos divertidos, como cultivar algodão ou recolher café, e tudo pago em moeda inglesa.

Os nativos não passavam o tempo à sombra da bananeira: já trabalhavam. Nas aldeias havia quem se dedicasse à pesca, quem à caça, quem cultivasse...enfim, faziam a vidinha deles, pelo que a ideia de ficar 10 horas por dia a cultivar plantas por conta de alguns estrangeiros não obteve grande sucesso. E os Ingleses ficaram mal, pois algodão e café eram óptimos bens para ser exportados e vendidos em todo o mundo.

Então, como convencer os nativos a deixar a vidinha deles para trabalhar como escravos nos campos dos Ingleses? Simples: com a emissão de dinheiro e a introdução de impostos.

Os Ingleses disseram: "Ó nativos, a partir de agora todos têm que pagar (a nós, claro) um imposto sobre as vossas cabanas, e têm que paga-lo com o nosso dinheiro. Obviamente ninguém põe em causa a liberdade de escolha e vocês podem continuar a não pagar. Só que neste caso as vossas cabanas vão ser incendiadas. A propósito: alguém tem um fósforo?"

Os desgraçados de nativos de repente viram-se com a necessidade urgente de encontrar dinheiro, e não dinheiro qualquer: o dinheiro dos Ingleses. O que poderiam fazer para encontrá-lo? Apenas uma coisa: trabalhar para os Ingleses, cultivar os tais algodão e café.

Isso é: forçados pela chantagem do tirano, encontraram-se subitamente desempregados, porque nenhum deles tinha um trabalho que permitisse ganhar a moeda de quem detinha o poder. E acabou a vidinha deles.


O tirano

Então, esta coisa dos Ingleses é História? Sim, verdade: é passado mas também é actualidade. É exactamente o que se passa hoje.

O Estado moderno tem o monopólio do dinheiro e pretende, com a força das leis, que todos nós (cidadãos, empresas) pagamos os impostos com o dinheiro que ele emite. Então, todos nós temos que trabalhar para isso, caso contrário é desemprego. O Estado impõe a sua moeda: o trabalhamos para ser pagos na moeda com que o Estado quer que sejam pagos os impostos ou estamos desempregados.

Alguns entre nós vão trabalhar por conta do Estado que, desta forma, tem pessoal suficiente para as suas funções; outros vão trabalhar no sector privado. Mas todos, sem excepção, têm que ganhar o dinheiro do Estado para pagar os impostos; então, também quem trabalha no sector privado exige que o seu salário seja pago na moeda do Estado. Porque um salário pago em Balboas ou em feijões não adianta.

Esta é a forma como o Estado que pode cobrar impostos se torna monopolista e utiliza a moeda dele para nos manter ligados a ele. O que significa que o Estado utiliza a moeda para garantir a sua existência, porque sem moeda e sem impostos não poderia existir. Sem impostos cobrados na moeda emitida pelo Estado, qualquer um poderia inventar uma outra moeda e usa-la, ignorando completamente o Estado.

Nesta obrigação, o Estado é de facto um tirano. Mas, como vimos, é uma tirania necessária ao Estado para que o mesmo possa existir.

Então, uma pergunta: mas afinal o dinheiro é um código abstracto que representa bens reias, como vimos nas primeiras duas partes, ou é uma invenção do Estados-tirano para nos obrigar a trabalhar por conta dele e pagar os seus impostos?

Podemos pensar: a resposta é "ambos", porque o dinheiro é tanto uma convenção (um código) quanto um instrumento utilizado pelo Estado. Podemos pensar isso, mas estaríamos errados: na sua forma actual, o dinheiro é em primeiro lugar uma invenção do Estado-tirano. Só depois é um código.

Algumas populações africanas utilizam as conchas de Cypraea e Monetaria come dinheiro. Aí não há necessidade nenhuma de existir um Estado ou de ir trabalhar por conta dele: é só ir até a praia para encher a carteira. Funciona? Sim, funciona há cerca de 5.000 anos e ninguém se queixa.

Neste caso, as conchas são o tal "código", representam uma riqueza (e são elas mesmo uma riqueza): ninguém tem o monopólio das conchas, ninguém as cria (a não ser a Natureza), ninguém diz "trabalha por mim em troca das conchas ou arraso-te a cabana". Por isso, originariamente o dinheiro
é a representação dum bem, é o tal código.

Mas nós não podemos ir até a praia para ficar ricos: temos de trabalhar. Só assim podemos pagar os impostos. E isso porque o dinheiro, na forma actual, é sim um código abstracto (não é riqueza) mas é sobretudo com os impostos uma invenção necessária ao Estado.


Ipse dixit.

Relacionados:
Parte I
Parte II
Parte IV

Fonte: na última parte



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